Os desafios de perguntar o “porquê”

Os desafios de perguntar o “porquê”
Tirinha interrogatório porque

Fazer perguntas é uma das ferramentas mais poderosas no arsenal de um designer, pesquisador ou estrategista. Entre elas, o “porquê” ocupa um lugar de destaque por sua capacidade de aprofundar o entendimento das motivações e necessidades dos usuários. No entanto, formular essa pergunta de maneira eficaz é um verdadeiro desafio. Quando feita de forma inadequada, a pergunta pode gerar respostas vagas, defensivas ou até mesmo enganosas, comprometendo o valor da pesquisa. Entender o equilíbrio entre explorar motivos e observar comportamentos é essencial para transformar o “porquê” em uma ferramenta realmente poderosa.

Como perguntas mal formuladas podem levar a respostas inúteis

Perguntar o “porquê” parece simples, mas a forma como a pergunta é feita pode determinar se a resposta será útil ou não. Quando mal formuladas, perguntas podem induzir o entrevistado a dar respostas genéricas, socialmente desejáveis ou que simplesmente não refletem a realidade.

Problemas comuns ao perguntar o “porquê”

Induzir a responsabilidade ou defesa:

Quando a pergunta soa acusatória, o usuário pode sentir que precisa justificar seu comportamento em vez de explicá-lo.

Exemplo de pergunta mal formulada: “Por que você não usou essa funcionalidade?”
Problema: Pode colocar o entrevistado na defensiva, de modo que pode gerar justificativas em vez de insights reais.

Focar em hipóteses pré-concebidas

Perguntas baseadas em suposições limitam o espaço para respostas genuínas.

Exemplo de pergunta mal formulada: “Por que você prefere nosso produto ao de outro concorrente?”
Problema: Supõe que o entrevistado prefere o produto, mesmo que isso possa não ser verdade.

Geração de respostas genéricas ou intangíveis

Algumas perguntas levam a respostas amplas que não ajudam a resolver problemas reais.

Exemplo de pergunta mal formulada: “Por que você quer algo mais fácil de usar?”
Problema: Não explora profundamente o que “fácil de usar” significa para o usuário.

Como melhorar perguntas do tipo “porquê”

Use perguntas abertas que incentivem narrativas e evitem julgamentos.

Exemplo melhorado: “Pode me contar o que aconteceu na última vez que você tentou usar essa funcionalidade?”
Por que funciona: Explora o contexto e a experiência sem pressionar o entrevistado a justificar suas ações.

Adicione contexto à pergunta para facilitar a resposta.

Exemplo melhorado: “O que você estava tentando fazer quando usou essa funcionalidade?”
Por que funciona: Enquadra o comportamento antes de perguntar o motivo.

A diferença entre entender motivos e observar comportamentos

Uma das armadilhas ao perguntar o “porquê” é depender exclusivamente das motivações declaradas dos usuários, ignorando o que eles fazem de fato. As motivações podem ser influenciadas por vieses, memória limitada ou desejo de responder de forma socialmente aceitável, enquanto os comportamentos observados são dados concretos que revelam a realidade.

Por que focar apenas em motivações pode ser perigoso

Vieses Cognitivos

As pessoas nem sempre sabem ou conseguem articular por que fazem algo. Elas podem dar uma explicação racional que, na prática, não reflete a verdadeira motivação.

Exemplo: Um usuário pode dizer que não usou um aplicativo porque “não tinha tempo”, mas a observação do comportamento pode revelar que o problema era a complexidade da interface.

Respostas Socialmente Desejáveis

Entrevistados podem distorcer suas respostas para se apresentarem de forma mais agradável e não paracer um detrator do produto, serviço ou empresa buscando uma aprovação social do entrevistador.

Exemplo: “Eu escolhi este produto porque ele é ambientalmente sustentável.”
Pode ser verdade, mas também pode ser uma resposta alinhada ao que o entrevistado acha que o pesquisador quer ouvir.

A importância de observar comportamentos

Observar o que os usuários realmente fazem é uma maneira valiosa de complementar o “porquê”. A análise de comportamentos fornece dados que podem ser cruzados com as respostas declaradas, ajudando a validar hipóteses.

Técnicas de observação de comportamento

  • Estudos etnográficos: Acompanhe os usuários em seu ambiente natural.
  • Testes de usabilidade: Observe como os usuários interagem com um produto.
  • Análise de dados: Use ferramentas analíticas para identificar tendências comportamentais.

Como combinar motivos e comportamentos

Para obter uma visão mais completa, combine perguntas qualitativas sobre motivos com métodos de observação de comportamento.

Exemplo:
Pergunte: “Por que você clicou nessa opção em vez de outra?”
Observe: Veja se a interação sugere algo diferente, como dificuldade em encontrar a outra opção.

Estratégias para formular perguntas “porquê” eficazes

Ao perguntar o “porquê”, adote estratégias que incentivem respostas detalhadas, contextuais e baseadas na experiência real do usuário. Aqui estão algumas táticas para melhorar a formulação:

Use técnicas baseadas em histórias

Em vez de perguntar diretamente o “porquê”, peça para o usuário descrever uma situação ou experiência.

Exemplo: “Pode descrever o que você fez quando tentou comprar o produto pela primeira vez?”

Aplique a técnica dos 5 porquês

Pergunte sucessivamente “por quê” para explorar camadas mais profundas de motivação, sem soar invasivo. Tente fazer uma sequência, um porquê para cada resposta dada. Porém se atente para não se prologar na sequência pra não soar como uma afronta e deixar o entrevistado na defensiva.

Exemplos:
Pergunta 1: “Por que você abandonou o carrinho de compras?”. Resposta: “Porque demorava pra preencher o formulário”
Pergunta 2: “Por que o tempo de preenchimento do formulário foi um problema?” Resposta: “Ee precisava procurar alguns dados que não tinha na mão”
Pergunta 3: “Por que não conseguiu encontrar os dados necessários rapidamente?” Resposta: “Eu estava trabalahndo.”

Reforce perguntas com evidências observáveis

Combine perguntas sobre motivos com observações reais de comportamento.

Conclusão

Perguntar o “porquê” é tanto uma arte quanto uma ciência. Embora seja uma ferramenta poderosa para compreender as motivações dos usuários, ela precisa ser usada com cuidado e estratégia. A chave para um “porquê” eficaz está em evitar julgamentos, estruturar a pergunta para incentivar respostas contextuais e combinar dados qualitativos com observação de comportamentos reais. Dessa forma, é possível transformar respostas em insights profundos que realmente informam decisões de design e estratégia.

Por hoje é só tudo isso pe-pessoal!!
Até a próxima!